quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Enquanto a Chuva Cai - Manuel Bandeira

Enquanto a Chuva Cai


A chuva cai. O ar fica mole . . .

Indistinto . . . ambarino . . . gris . . .

E no monótono matiz

Da névoa enovelada bole

A folhagem como o bailar.

Torvelinhai, torrentes do ar!

Cantai, ó bátega chorosa,

As velhas árias funerais.

Minh'alma sofre e sonha e goza

À cantilena dos beirais.

Meu coração está sedento

De tão ardido pelo pranto.

Dai um brando acompanhamento

À canção do meu desencanto.

Volúpia dos abandonados . . .

Dos sós . . . — ouvir a água escorrer,

Lavando o tédio dos telhados

Que se sentem envelhecer . . .

Ó caro ruído embalador,

Terno como a canção das amas!

Canta as baladas que mais amas,

Para embalar a minha dor!

A chuva cai. A chuva aumenta.

Cai, benfazeja, a bom cair!

Contenta as árvores! Contenta

As sementes que vão abrir!

Eu te bendigo, água que inundas!

Ó água amiga das raízes,

Que na mudez das terras fundas

Às vezes são tão infelizes!

E eu te amo! Quer quando fustigas

Ao sopro mau dos vendavais

As grandes árvores antigas,

Quer quando mansamente cais.

Manuel Bandeira

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